A GÊNESE
Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo
O livro A Gênese, um dos cinco livros fundamentais do Espiritismo, foi publicado um ano antes de Kardec desencarnar.
Conversamos com Wlademir Lisso, um grande conhecedor e estudioso da obra.
Com uma vasta experiência no trabalho assistencial, Wlademir Lisso atualmente ocupa o cargo de diretor da área de Assistência Espiritual da Federação Espírita do Estado de São Paulo (FEESP), pela qual passam, por mês, aproximadamente 200 mil pessoas.
Lisso é formado em Direito pela Universidade de São Paulo e, desde 1968, tem participado e desenvolvido atividades ligadas à Doutrina Espírita. Na parte de estudos, tem feito um trabalho voltado à questão científica, o que inclui um curso sobre A Gênese, obra que estuda há 10 anos.
Esse tipo de assunto de que trata a Gênese é bem aceito e o público muito é receptivo, mas Lisso faz uma ressalva: "Desde que não se cometa o erro que alguns cientistas cometem ao tentar aproximar a ciência da religião. Por exemplo, existe um curso na USP sobre as Fronteiras da Ciência e da Religião (um aluno da FEESP, que fez o curso na USP, me deu um CD desse curso). Quando o cientista dá esse curso, tentando aproximar a ciência da religião, ele não consegue atravessar a fronteira entre ciência e religião. Normalmente, ele dá uma pincelada rápida na religião. Já a proposta do livro A Gênese não é essa, mas sim conhecer de ciência, o que é importante para compreender melhor o Espiritismo."
Wlademir também nos fala que não precisamos ser profundos conhecedores de ciência para se compreender os assuntos tratados na Gênese, e isso é dito pelos Espíritos na própria obra. É preciso saber apenas o suficiente para entender seu conteúdo.
O trabalho na Doutrina, explica Lisso, não é começar da ciência para o Espiritismo, e sim do Espiritismo para a ciência, sempre buscando os pontos em que a ciência está chegando perto do Espiritismo.
"Há um interesse muito grande das pessoas por esse conhecimento maior que a Gênese traz. Os próprios Espíritos esclarecem, na introdução da obra, que as informações contidas na Gênese teriam de vir depois das primeiras obras da codificação, porque ela é justamente um passo a mais nas conseqüências e aplicações do Espiritismo. Sendo assim, é preciso ter a base das outras obras para depois fazer o estudo da Gênese."
"Venho sentindo muita necessidade de um Espiritismo apresentado com mais profundidade", prossegue Wlademir Lisso, "porque o Espiritismo de massa que nós estamos desenvolvendo está muito superficial, muito light. Na minha opinião, ele está voltado para trazer muito público e, na verdade, o Espiritismo não deve ser quantitativo e sim qualitativo. O que importa não é tanto um número enorme de pessoas que não estão entendendo nada, mas um número razoável de pessoas que tenham interesse e capacidade de compreender o que se está aprendendo."
Segundo ele, durante os dez anos em que apresenta a Gênese nos cursos na FEESP e em muitas casas espíritas, tem percebido que há justamente um ponto básico: Deus, uma presença imanente no universo. E a presença imanente de Deus está no fenômeno material. "Então, se Deus está ali, no fenômeno material, como criador, o início da espiritualização começa pela manifestação imanente de Deus na matéria. Por isso, precisamos primeiro estudar a matéria. É O próprio Kardec quem faz essa afirmação."
"Os Espíritos também disseram a Kardec que, se o Espiritismo tivesse vindo antes da ciência, ele teria sido abortado. Nesse sentido, o plano da Gênese é que a pessoa estude Deus na sua manifestação imanente, porque no momento em que a ciência pára na pesquisa do fenômeno material com base no estudo da manifestação de Deus na matéria, a pessoa tem a capacidade de transcender. É aí, nessa fronteira, que a ciência não nos acompanha mais;"
Lisso ainda levanta outro ponto importante. Ao pensarem em reeditar a Gênese, com uma tradução parcial feita por J. Herculano Pires, perceberam que o livro - para ele, o mais importante da codificação - não tem mercado; ou seja, ninguém compra, ninguém lê.
"Isso acontece porque a Gênese não é um livro didático; tem conceitos muito importantes, mas muito condensados, parágrafos muito longos que acabam cansando as pessoas. Esse foi o motivo que tornou a idéia do curso viável. Ele vingou porque é didático e temos como suporte a projeção de filmes ilustrados e data, show."
A dificuldade de Lisso para montar esse curso foi porque precisou estudar biologia, física, genética, astronomia, entre outras ciências, para trazer para o Espiritismo. "Acredito que seja por isso que as pessoas não enfrentam o desafio de montá-lo, porque é bem difícil. Esse curso que vai se encerrar em junho é composto por 32 aulas. Encaixei um filme técnico para cada tema. O trabalho é grande, mas tem um público que é receptivo e, além disso, sou muito amparado."
A palavra gênese está relacionada a origem, geração, à formação dos seres. Nesse sentido, o livro A Gênese encerra um vasto conhecimento sobre a origem divina do homem. Você poderia nos apresentar, em linhas gerais, quais as informações transmitidas pelo livro, sua importância e as principais diferenças existentes entre a Gênese mosaica e a de Kardec?
Se você prestar atenção à evolução do assunto na Gênese, verá que ela é absolutamente lógica. No primeiro capítulo, temos características da revelação espírita; na seqüência, fala-se sobre Deus, o bem e o mal, o instinto e a inteligência, cosmologia, Gênese Orgânica, e tudo isso para preparar a Gênese Espiritual, que vem logo em seguida, num encadear de assuntos perfeitamente claro.
A Gênese de Kardec é completamente diferente da Gênese mosaica, que vem de uma era pré-ciência, a qual chamamos de observacional. Somente a partir de Galileu, no século 16, é que a ciência experimental se desenvolve. Na Gênese Mosaica a abordagem é observacional e simbólica. Para citar alguns exemplos, temos a questão do primeiro casal, a formação da Terra, entre outros.
A Gênese espírita -trabalha com base na ciência que já existia no século 19. A importância da obra, como já mencionei, é justamente a seguinte: para que você se entenda como espírito e se integre com Deus, há a necessidade de desenvolver o estudo da manifestação de Deus e do Espírito no imanente. A imanência de Deus e do Espírito está na criação material.
Quando encarna, o espírito se liga ao corpo físico e, nesse processo, ele desenvolve a formação orgânica desse corpo. Sendo assim, o corpo físico é então um produto da manifestação imanente do Espírito e de Deus também.
Quando você consegue compreender a manifestação imanente de Deus e do Espírito na matéria, fica mais fácil atravessar a fronteira entre a matéria e as coisas do espírito, dando início à transcendência. É através do raciocínio abstrato que passamos a compreender mais.
O Espiritismo racional depende dessa base científica. Ela é essencial. A Gênese de Kardec fala sobre astronomia, a formação do universo, a formação das galáxias, a formação dos sistemas solares, a formação dos planetas, dos satélites, dos cometas; depois, ela trata dos seres vivos no processo de gênese orgânica e começa a falar da Gênese Espiritual e reencarnação.
Depois de passar pela gênese espiritual, entramos na teoria dos fluidos, que é fundamental para entender cientificamente o passe e sua fenomenologia. Vemos na seqüência a explicação dos milagres, também muito importante, parte em que são expostas as informações sobre catalepsia, entre outros.
Basicamente, a teoria dos fluidos antecede os milagres porque, com base nessa teoria espírita - que não tem correspondente na ciência hoje -, é que se começa a entender os milagres racionalmente.
Assim, a Gênese termina com a geração nova, prevendo a era de transição do planeta, que teria começado no século 19. Portanto, não estaria sendo prometida para o século 20 ou 21, e vai atravessar um período mais ou menos longo, dependendo do nosso livre-arbítrio.
Nas minhas palestras, eu tenho falado que a situação do planeta hoje, em termos de relação entre nações e entre os seres humanos, principalmente relacionando o problema de solidariedade, faz a gente visualizar alguns séculos que podem ser poucos ou mais, de dificuldades maiores do que estamos enfrentando hoje. Isso porque os problemas continuam sem solução, e ainda aparecem problemas novos que se acrescentam a esses.
Por exemplo, estou abrindo um curso sobre a família na FEESP, com oito aulas, e tenho dito que, nos Estados Unidos, 55% dos casais se separa. Estatísticas da ONU revelam que no máximo 12% das separações são amigáveis; nesses casos, as pessoas "saem numa boa" e continuam se casando, coisa e tal. Os outros 88%, não. Para essas pessoas, o ódio, o ressentimento e a mágoa permanecem prejudicando suas vidas. Então, veja: dos 88% desses 55% de separações, ocorre um adiamento de reajuste. Então, não se pode esperar para a próxima reencarnação o equilíbrio na família concorda?
Assim também acontece com a educação das crianças, que acabam - se tornando bastante problemáticas.
Então, temos que fazer uma renovação moral, porque mesmo com todo o avanço que temos hoje na tecnologia, sem o desenvolvimento moral não vamos a lugar algum.
Como é dito no Livro dos Espíritos: "A inteligência, sem senso moral, acaba deixando muito a desejar".
O lançamento do livro A Gênese nas livrarias de Paris, em 1868, provocou críticas e aplausos entre os franceses. Essa é uma informação apresentada por J. Herculano Pires, em edição brasileira do livro. Sendo assim, quais foram os maiores desafios enfrentados por Kardec ao trazer questões até então de cunho religioso, de uma forma tão bem estruturada em base científica, e ainda respondidas pelos Espíritos?
A Gênese vem após a preparação do terreno feita pelo Livro dos Espíritos. Tanto ela quanto o Livro dos Espíritos têm um conteúdo científico, principalmente na parte em que é abordada a formação do mundo.
Na época em que a Gênese foi elaborada, a ciência estava se desenvolvendo. Kardec foi contemporâneo de Charles Darwin, e tanto a teoria da evolução quanto a Gênese foram lançadas na mesma época. A obra de Kardec, inclusive, incorpora indiretamente a teoria da evolução das espécies de Darwin e do transformismo.
A ciência do século 19, mesmo sendo ainda embrionária, tinha algum respaldo, como da astronomia, por exemplo.
No Livro dos Espíritos, a classificação dos seres orgânicos e inorgânicos foi baseada numa teoria científica chamada teoria da vitalidade. Essa teoria científica foi derrubada anos após a edição do Livro dos Espíritos, mas ela definia que o que separa o orgânico do inorgânico era algo que se chamava vitalidade. Sendo assim, nesse ponto O Livro dos Espíritos está desatualizado, porém não do ponto de vista espiritual.
Quanto ao conteúdo da Gênese; em face ao momento atual, pode-se acrescentar muita coisa, quando procuramos atualisá-la. Podemos acrescentar muitos conceitos como os da física quântica, que é uma ciência nova, da genética, da paleontologia, entre outras. De nenhuma forma a Gênese pode ser vista como uma obra desatualizada.
Mesmo o Livro dos Médiuns, que algumas pessoas "ignorantes" falam que está desatualizado, não está!
Para enriquecer o conteúdo da Gênese, na aula procuro acrescentar - por exemplo, sobre o instinto e a inteligência -, informações encontradas na neurologia que provam a existência da inteligência inconsciente, da memória, que não se explicava antigamente.
Outro exemplo é o da teoria da geração espontânea. Ao lermos na Gênese o que Kardec apresenta com relação à geração espontânea, conseguimos entender seu conteúdo, que não está ultrapassado. Quando ele está se referindo à geração espontânea, não está tratando dos seres complexos, mas sim' do aparecimento de novas espécies a partir do desenvolvimento de uma espécie anterior. Sendo assim, a geração espontânea de uma espécie surge por transformismo da espécie anterior. Essa teoria de Kardec é vista por alguns como se fosse aquela que, por exemplo, nos diz que de uma cobra morta e moída formavam-se cobras novas.
Durante esses dez anos em que tenho detalhado a Gênese nos cursos nunca houve, por parte dos participantes, qualquer tipo de contestação com relação ao conteúdo transmitido, e posso afirmar que a freqüência de biólogos e físicos, por exemplo, é bastante grande.
Quanto à questão da dificuldade enfrentada por Kardec para editar a Gênese; podemos dizer que, mesmo tendo o seu conteúdo sido passado pelos Espíritos algum tempo antes - inclusive, em grande parte já tendo sido apresentado na Revista Espírita -,a edição dessa obra foi bastante adiada. Ela saiu num momento em que havia pessoas que talvez não estivessem de acordo com sua edição.
Sabe-se que a Gênese foi o último livro feito por Kardec, aquele que encerrou a obra da Codificação Espírita, pois faleceu um ano depois de publicá-la. Podemos dizer que essa obra completou as anteriores e exigiu um grande amadurecimento do autor?
O Espírito que faz a apresentação da Gênese diz que ela é um passo adiante nas conseqüências e aplicações do Espiritismo.
A Gênese não só complementou como modificou algumas obras da codificação. Por exemplo, eu sei que tem muito expositor por aí dando aula de Espiritismo e passando informação errada por desconhecimento da Gênese.
A possessão é uma questão que Kardec aborda no Livro dos Médiuns, não aceita na definição tradicional de incorporação do Espírito. Na Gênese, depois de uma série de experiências relatadas na Revista Espírita, ele dá por existente a possessão, como sendo a incorporação do Espírito no próprio organismo do médium ou do obsidiado. Então, se formos apenas nos basear no Livro dos Médiuns, teremos as informações sobre a possessão que estão superadas. Pelo menos que eu saiba, só esse assunto que apresentei está desatualizado no Livro dos Médiuns.
Outra parte que considero importante na Gênese é aquela que explica como Jesus amainou a tempestade. Com relação a essa passagem, no Livro dos Espíritos Kardec aventa a possibilidade da existência dos espíritos da natureza. Não estou me referindo aos elementais. No sentindo de Kardec, espíritos da natureza são espíritos inferiores que, naquele momento, estão ligados aos fenômenos naturais, mas que vão evoluir; já o elemental, não evoluiu.
Quando, na Gênese, Kardec explica o fenômeno da tempestade aplacada, ele pontua que "se existirem os espíritos ligados aos fenômenos naturais", Jesus, com sua grande autoridade, poderia ter mandado esses espíritos pararem a tempestade. Em seguida, ele também coloca: "Se não existirem esses espíritos da natureza, Jesus com sua clarividência teria visto que a tempestade iria parar logo em seguida".
Portanto, no Livro dos Espíritos, lê-se que os espíritos da natureza existem e na Gênese há uma modificação feita pelo Kardec.
É por tudo isso que, na apresentação da Gênese, um Espírito diz que ela é um passo além.
Um ponto importante esclarecido na introdução da obra se refere à codificação como sendo a manifestação de uma coletividade de Espíritos. A manifestação de uma coletividade de Espíritos não pode ser modificada pela manifestação de uma individualidade espiritual. A Gênese é clara quando nos apresenta essa informação de que uma coletividade de Espíritos em senso comum, consenso coletivo, teria auxiliado Kardec na codificação.
Nesse sentido, faço uma crítica aos conceitos que o André Luiz trouxe, contrários à Gênese e ao Livro dos Médiuns, tipicamente os centros de força e a píneal.
No Livro dos Médiuns, Kardec trata a manifestação mediúnica no cérebro como um todo. A neurotecnologia já está constatando que a manifestação da espiritualidade no cérebro é localizada no lobo frontal, batendo portanto com a informação contida no Livro dos Médiuns e também com a apresentada pelo Espírito Emmanuel.
A obra do André Luiz acabou assumindo um papel muito importante, prevalecendo muitas vezes, mas é contrária à codificação.
Numa entrevista com Ary Lex - autor de diversos livros e conhecimento no meio espírita - o espírito André Luiz deu a seguinte autorização: "Se alguma coisa que eu disser não estiver certa, por favor me corrijam".
Às vezes, aceita-se o que o André Luiz diz em detrimento do que a codificação apresenta. Nos aspectos espirituais, não se pode modificar um conceito com uma opinião isolada de um Espírito.
Na sua opinião, quais são as grandes revelações apontadas na Gênese que poderão trazer um grande avanço para o futuro do homem e da ciência?
Em termos de antecipar alguma coisa da ciência, há conceitos importantes na Gênese. Apesar de ter sido tratado no Livro dos Espíritos, a pluralidade dos mundos habitados era assunto considerado absurdo no século 19, e passou a ser visto como uma possibilidade totalmente viável a partir do século 20.
Uma outra abordagem importante que eu vejo na Gênese é a teoria que ela apresenta sobre o "elo perdido". Nela, Kardec diz que os primeiros espíritos que adquiriram a característica humana. não encontrando corpos humanos na Terra, encarnaram nos macacos. A partir desse ponto, ele então faz toda uma análise, dizendo que o espírito humano no macaco, do ponto de vista espiritual, não é um animal. Isso é uma teoria muito nova.
Helena Blavatsky também apresenta um conceito sobre o assunto, não ?
Sim, só que ela trabalha a idéia da alma coletiva animal. Essa questão ainda não foi desvendada pela ciência, mas para o Espiritismo é do maior interesse.
Outro tema já abordado no século 19 e sobre a qual Kardec também tem uma teoria é a existência de civilizações anteriores a nossa e que podem ter existido na Terra. A humanidade vem se desenvolvendo há mais de 100 mil anos, mas a história que vem do Velho Testamento, a história linear, retroage há 5.000 anos.
Segundo Kardec, os Espíritos que formaram essas civilizações evoluíram muito e emigraram para planos do universo mais adiantados. Então, a Terra entrou numa fase de descanso - como a que nós estamos agora-, para começar a nossa civilização.
A idéia dos atlantes, muito discutida hoje, ele também antecipa, e um outro assunto de que não se fala muito, exceto em algumas doutrinas espiritualistas, refere-se aos focos de criação.
O escritor J. Benítez, que na minha opinião é uma pessoa brilhante, um profeta do mundo moderno. em sua obra Rebelião de Lúcifer também afirma que no universo não existiu um único foco de criação. Existiram muitos focos de criação nos quais Deus se manifestou.
Todos esses temas que a ciência na época de Kardec citava. estão se desenvolvendo apenas agora em nossos dias.
Revista ESPIRITISMO & CIENCIA. Ano 4 nº40
Conversamos com Wlademir Lisso, um grande conhecedor e estudioso da obra.
Com uma vasta experiência no trabalho assistencial, Wlademir Lisso atualmente ocupa o cargo de diretor da área de Assistência Espiritual da Federação Espírita do Estado de São Paulo (FEESP), pela qual passam, por mês, aproximadamente 200 mil pessoas.
Lisso é formado em Direito pela Universidade de São Paulo e, desde 1968, tem participado e desenvolvido atividades ligadas à Doutrina Espírita. Na parte de estudos, tem feito um trabalho voltado à questão científica, o que inclui um curso sobre A Gênese, obra que estuda há 10 anos.
Esse tipo de assunto de que trata a Gênese é bem aceito e o público muito é receptivo, mas Lisso faz uma ressalva: "Desde que não se cometa o erro que alguns cientistas cometem ao tentar aproximar a ciência da religião. Por exemplo, existe um curso na USP sobre as Fronteiras da Ciência e da Religião (um aluno da FEESP, que fez o curso na USP, me deu um CD desse curso). Quando o cientista dá esse curso, tentando aproximar a ciência da religião, ele não consegue atravessar a fronteira entre ciência e religião. Normalmente, ele dá uma pincelada rápida na religião. Já a proposta do livro A Gênese não é essa, mas sim conhecer de ciência, o que é importante para compreender melhor o Espiritismo."
Wlademir também nos fala que não precisamos ser profundos conhecedores de ciência para se compreender os assuntos tratados na Gênese, e isso é dito pelos Espíritos na própria obra. É preciso saber apenas o suficiente para entender seu conteúdo.
O trabalho na Doutrina, explica Lisso, não é começar da ciência para o Espiritismo, e sim do Espiritismo para a ciência, sempre buscando os pontos em que a ciência está chegando perto do Espiritismo.
"Há um interesse muito grande das pessoas por esse conhecimento maior que a Gênese traz. Os próprios Espíritos esclarecem, na introdução da obra, que as informações contidas na Gênese teriam de vir depois das primeiras obras da codificação, porque ela é justamente um passo a mais nas conseqüências e aplicações do Espiritismo. Sendo assim, é preciso ter a base das outras obras para depois fazer o estudo da Gênese."
"Venho sentindo muita necessidade de um Espiritismo apresentado com mais profundidade", prossegue Wlademir Lisso, "porque o Espiritismo de massa que nós estamos desenvolvendo está muito superficial, muito light. Na minha opinião, ele está voltado para trazer muito público e, na verdade, o Espiritismo não deve ser quantitativo e sim qualitativo. O que importa não é tanto um número enorme de pessoas que não estão entendendo nada, mas um número razoável de pessoas que tenham interesse e capacidade de compreender o que se está aprendendo."
Segundo ele, durante os dez anos em que apresenta a Gênese nos cursos na FEESP e em muitas casas espíritas, tem percebido que há justamente um ponto básico: Deus, uma presença imanente no universo. E a presença imanente de Deus está no fenômeno material. "Então, se Deus está ali, no fenômeno material, como criador, o início da espiritualização começa pela manifestação imanente de Deus na matéria. Por isso, precisamos primeiro estudar a matéria. É O próprio Kardec quem faz essa afirmação."
"Os Espíritos também disseram a Kardec que, se o Espiritismo tivesse vindo antes da ciência, ele teria sido abortado. Nesse sentido, o plano da Gênese é que a pessoa estude Deus na sua manifestação imanente, porque no momento em que a ciência pára na pesquisa do fenômeno material com base no estudo da manifestação de Deus na matéria, a pessoa tem a capacidade de transcender. É aí, nessa fronteira, que a ciência não nos acompanha mais;"
Lisso ainda levanta outro ponto importante. Ao pensarem em reeditar a Gênese, com uma tradução parcial feita por J. Herculano Pires, perceberam que o livro - para ele, o mais importante da codificação - não tem mercado; ou seja, ninguém compra, ninguém lê.
"Isso acontece porque a Gênese não é um livro didático; tem conceitos muito importantes, mas muito condensados, parágrafos muito longos que acabam cansando as pessoas. Esse foi o motivo que tornou a idéia do curso viável. Ele vingou porque é didático e temos como suporte a projeção de filmes ilustrados e data, show."
A dificuldade de Lisso para montar esse curso foi porque precisou estudar biologia, física, genética, astronomia, entre outras ciências, para trazer para o Espiritismo. "Acredito que seja por isso que as pessoas não enfrentam o desafio de montá-lo, porque é bem difícil. Esse curso que vai se encerrar em junho é composto por 32 aulas. Encaixei um filme técnico para cada tema. O trabalho é grande, mas tem um público que é receptivo e, além disso, sou muito amparado."
A palavra gênese está relacionada a origem, geração, à formação dos seres. Nesse sentido, o livro A Gênese encerra um vasto conhecimento sobre a origem divina do homem. Você poderia nos apresentar, em linhas gerais, quais as informações transmitidas pelo livro, sua importância e as principais diferenças existentes entre a Gênese mosaica e a de Kardec?
Se você prestar atenção à evolução do assunto na Gênese, verá que ela é absolutamente lógica. No primeiro capítulo, temos características da revelação espírita; na seqüência, fala-se sobre Deus, o bem e o mal, o instinto e a inteligência, cosmologia, Gênese Orgânica, e tudo isso para preparar a Gênese Espiritual, que vem logo em seguida, num encadear de assuntos perfeitamente claro.
A Gênese de Kardec é completamente diferente da Gênese mosaica, que vem de uma era pré-ciência, a qual chamamos de observacional. Somente a partir de Galileu, no século 16, é que a ciência experimental se desenvolve. Na Gênese Mosaica a abordagem é observacional e simbólica. Para citar alguns exemplos, temos a questão do primeiro casal, a formação da Terra, entre outros.
A Gênese espírita -trabalha com base na ciência que já existia no século 19. A importância da obra, como já mencionei, é justamente a seguinte: para que você se entenda como espírito e se integre com Deus, há a necessidade de desenvolver o estudo da manifestação de Deus e do Espírito no imanente. A imanência de Deus e do Espírito está na criação material.
Quando encarna, o espírito se liga ao corpo físico e, nesse processo, ele desenvolve a formação orgânica desse corpo. Sendo assim, o corpo físico é então um produto da manifestação imanente do Espírito e de Deus também.
Quando você consegue compreender a manifestação imanente de Deus e do Espírito na matéria, fica mais fácil atravessar a fronteira entre a matéria e as coisas do espírito, dando início à transcendência. É através do raciocínio abstrato que passamos a compreender mais.
O Espiritismo racional depende dessa base científica. Ela é essencial. A Gênese de Kardec fala sobre astronomia, a formação do universo, a formação das galáxias, a formação dos sistemas solares, a formação dos planetas, dos satélites, dos cometas; depois, ela trata dos seres vivos no processo de gênese orgânica e começa a falar da Gênese Espiritual e reencarnação.
Depois de passar pela gênese espiritual, entramos na teoria dos fluidos, que é fundamental para entender cientificamente o passe e sua fenomenologia. Vemos na seqüência a explicação dos milagres, também muito importante, parte em que são expostas as informações sobre catalepsia, entre outros.
Basicamente, a teoria dos fluidos antecede os milagres porque, com base nessa teoria espírita - que não tem correspondente na ciência hoje -, é que se começa a entender os milagres racionalmente.
Assim, a Gênese termina com a geração nova, prevendo a era de transição do planeta, que teria começado no século 19. Portanto, não estaria sendo prometida para o século 20 ou 21, e vai atravessar um período mais ou menos longo, dependendo do nosso livre-arbítrio.
Nas minhas palestras, eu tenho falado que a situação do planeta hoje, em termos de relação entre nações e entre os seres humanos, principalmente relacionando o problema de solidariedade, faz a gente visualizar alguns séculos que podem ser poucos ou mais, de dificuldades maiores do que estamos enfrentando hoje. Isso porque os problemas continuam sem solução, e ainda aparecem problemas novos que se acrescentam a esses.
Por exemplo, estou abrindo um curso sobre a família na FEESP, com oito aulas, e tenho dito que, nos Estados Unidos, 55% dos casais se separa. Estatísticas da ONU revelam que no máximo 12% das separações são amigáveis; nesses casos, as pessoas "saem numa boa" e continuam se casando, coisa e tal. Os outros 88%, não. Para essas pessoas, o ódio, o ressentimento e a mágoa permanecem prejudicando suas vidas. Então, veja: dos 88% desses 55% de separações, ocorre um adiamento de reajuste. Então, não se pode esperar para a próxima reencarnação o equilíbrio na família concorda?
Assim também acontece com a educação das crianças, que acabam - se tornando bastante problemáticas.
Então, temos que fazer uma renovação moral, porque mesmo com todo o avanço que temos hoje na tecnologia, sem o desenvolvimento moral não vamos a lugar algum.
Como é dito no Livro dos Espíritos: "A inteligência, sem senso moral, acaba deixando muito a desejar".
O lançamento do livro A Gênese nas livrarias de Paris, em 1868, provocou críticas e aplausos entre os franceses. Essa é uma informação apresentada por J. Herculano Pires, em edição brasileira do livro. Sendo assim, quais foram os maiores desafios enfrentados por Kardec ao trazer questões até então de cunho religioso, de uma forma tão bem estruturada em base científica, e ainda respondidas pelos Espíritos?
A Gênese vem após a preparação do terreno feita pelo Livro dos Espíritos. Tanto ela quanto o Livro dos Espíritos têm um conteúdo científico, principalmente na parte em que é abordada a formação do mundo.
Na época em que a Gênese foi elaborada, a ciência estava se desenvolvendo. Kardec foi contemporâneo de Charles Darwin, e tanto a teoria da evolução quanto a Gênese foram lançadas na mesma época. A obra de Kardec, inclusive, incorpora indiretamente a teoria da evolução das espécies de Darwin e do transformismo.
A ciência do século 19, mesmo sendo ainda embrionária, tinha algum respaldo, como da astronomia, por exemplo.
No Livro dos Espíritos, a classificação dos seres orgânicos e inorgânicos foi baseada numa teoria científica chamada teoria da vitalidade. Essa teoria científica foi derrubada anos após a edição do Livro dos Espíritos, mas ela definia que o que separa o orgânico do inorgânico era algo que se chamava vitalidade. Sendo assim, nesse ponto O Livro dos Espíritos está desatualizado, porém não do ponto de vista espiritual.
Quanto ao conteúdo da Gênese; em face ao momento atual, pode-se acrescentar muita coisa, quando procuramos atualisá-la. Podemos acrescentar muitos conceitos como os da física quântica, que é uma ciência nova, da genética, da paleontologia, entre outras. De nenhuma forma a Gênese pode ser vista como uma obra desatualizada.
Mesmo o Livro dos Médiuns, que algumas pessoas "ignorantes" falam que está desatualizado, não está!
Para enriquecer o conteúdo da Gênese, na aula procuro acrescentar - por exemplo, sobre o instinto e a inteligência -, informações encontradas na neurologia que provam a existência da inteligência inconsciente, da memória, que não se explicava antigamente.
Outro exemplo é o da teoria da geração espontânea. Ao lermos na Gênese o que Kardec apresenta com relação à geração espontânea, conseguimos entender seu conteúdo, que não está ultrapassado. Quando ele está se referindo à geração espontânea, não está tratando dos seres complexos, mas sim' do aparecimento de novas espécies a partir do desenvolvimento de uma espécie anterior. Sendo assim, a geração espontânea de uma espécie surge por transformismo da espécie anterior. Essa teoria de Kardec é vista por alguns como se fosse aquela que, por exemplo, nos diz que de uma cobra morta e moída formavam-se cobras novas.
Durante esses dez anos em que tenho detalhado a Gênese nos cursos nunca houve, por parte dos participantes, qualquer tipo de contestação com relação ao conteúdo transmitido, e posso afirmar que a freqüência de biólogos e físicos, por exemplo, é bastante grande.
Quanto à questão da dificuldade enfrentada por Kardec para editar a Gênese; podemos dizer que, mesmo tendo o seu conteúdo sido passado pelos Espíritos algum tempo antes - inclusive, em grande parte já tendo sido apresentado na Revista Espírita -,a edição dessa obra foi bastante adiada. Ela saiu num momento em que havia pessoas que talvez não estivessem de acordo com sua edição.
Sabe-se que a Gênese foi o último livro feito por Kardec, aquele que encerrou a obra da Codificação Espírita, pois faleceu um ano depois de publicá-la. Podemos dizer que essa obra completou as anteriores e exigiu um grande amadurecimento do autor?
O Espírito que faz a apresentação da Gênese diz que ela é um passo adiante nas conseqüências e aplicações do Espiritismo.
A Gênese não só complementou como modificou algumas obras da codificação. Por exemplo, eu sei que tem muito expositor por aí dando aula de Espiritismo e passando informação errada por desconhecimento da Gênese.
A possessão é uma questão que Kardec aborda no Livro dos Médiuns, não aceita na definição tradicional de incorporação do Espírito. Na Gênese, depois de uma série de experiências relatadas na Revista Espírita, ele dá por existente a possessão, como sendo a incorporação do Espírito no próprio organismo do médium ou do obsidiado. Então, se formos apenas nos basear no Livro dos Médiuns, teremos as informações sobre a possessão que estão superadas. Pelo menos que eu saiba, só esse assunto que apresentei está desatualizado no Livro dos Médiuns.
Outra parte que considero importante na Gênese é aquela que explica como Jesus amainou a tempestade. Com relação a essa passagem, no Livro dos Espíritos Kardec aventa a possibilidade da existência dos espíritos da natureza. Não estou me referindo aos elementais. No sentindo de Kardec, espíritos da natureza são espíritos inferiores que, naquele momento, estão ligados aos fenômenos naturais, mas que vão evoluir; já o elemental, não evoluiu.
Quando, na Gênese, Kardec explica o fenômeno da tempestade aplacada, ele pontua que "se existirem os espíritos ligados aos fenômenos naturais", Jesus, com sua grande autoridade, poderia ter mandado esses espíritos pararem a tempestade. Em seguida, ele também coloca: "Se não existirem esses espíritos da natureza, Jesus com sua clarividência teria visto que a tempestade iria parar logo em seguida".
Portanto, no Livro dos Espíritos, lê-se que os espíritos da natureza existem e na Gênese há uma modificação feita pelo Kardec.
É por tudo isso que, na apresentação da Gênese, um Espírito diz que ela é um passo além.
Um ponto importante esclarecido na introdução da obra se refere à codificação como sendo a manifestação de uma coletividade de Espíritos. A manifestação de uma coletividade de Espíritos não pode ser modificada pela manifestação de uma individualidade espiritual. A Gênese é clara quando nos apresenta essa informação de que uma coletividade de Espíritos em senso comum, consenso coletivo, teria auxiliado Kardec na codificação.
Nesse sentido, faço uma crítica aos conceitos que o André Luiz trouxe, contrários à Gênese e ao Livro dos Médiuns, tipicamente os centros de força e a píneal.
No Livro dos Médiuns, Kardec trata a manifestação mediúnica no cérebro como um todo. A neurotecnologia já está constatando que a manifestação da espiritualidade no cérebro é localizada no lobo frontal, batendo portanto com a informação contida no Livro dos Médiuns e também com a apresentada pelo Espírito Emmanuel.
A obra do André Luiz acabou assumindo um papel muito importante, prevalecendo muitas vezes, mas é contrária à codificação.
Numa entrevista com Ary Lex - autor de diversos livros e conhecimento no meio espírita - o espírito André Luiz deu a seguinte autorização: "Se alguma coisa que eu disser não estiver certa, por favor me corrijam".
Às vezes, aceita-se o que o André Luiz diz em detrimento do que a codificação apresenta. Nos aspectos espirituais, não se pode modificar um conceito com uma opinião isolada de um Espírito.
Na sua opinião, quais são as grandes revelações apontadas na Gênese que poderão trazer um grande avanço para o futuro do homem e da ciência?
Em termos de antecipar alguma coisa da ciência, há conceitos importantes na Gênese. Apesar de ter sido tratado no Livro dos Espíritos, a pluralidade dos mundos habitados era assunto considerado absurdo no século 19, e passou a ser visto como uma possibilidade totalmente viável a partir do século 20.
Uma outra abordagem importante que eu vejo na Gênese é a teoria que ela apresenta sobre o "elo perdido". Nela, Kardec diz que os primeiros espíritos que adquiriram a característica humana. não encontrando corpos humanos na Terra, encarnaram nos macacos. A partir desse ponto, ele então faz toda uma análise, dizendo que o espírito humano no macaco, do ponto de vista espiritual, não é um animal. Isso é uma teoria muito nova.
Helena Blavatsky também apresenta um conceito sobre o assunto, não ?
Sim, só que ela trabalha a idéia da alma coletiva animal. Essa questão ainda não foi desvendada pela ciência, mas para o Espiritismo é do maior interesse.
Outro tema já abordado no século 19 e sobre a qual Kardec também tem uma teoria é a existência de civilizações anteriores a nossa e que podem ter existido na Terra. A humanidade vem se desenvolvendo há mais de 100 mil anos, mas a história que vem do Velho Testamento, a história linear, retroage há 5.000 anos.
Segundo Kardec, os Espíritos que formaram essas civilizações evoluíram muito e emigraram para planos do universo mais adiantados. Então, a Terra entrou numa fase de descanso - como a que nós estamos agora-, para começar a nossa civilização.
A idéia dos atlantes, muito discutida hoje, ele também antecipa, e um outro assunto de que não se fala muito, exceto em algumas doutrinas espiritualistas, refere-se aos focos de criação.
O escritor J. Benítez, que na minha opinião é uma pessoa brilhante, um profeta do mundo moderno. em sua obra Rebelião de Lúcifer também afirma que no universo não existiu um único foco de criação. Existiram muitos focos de criação nos quais Deus se manifestou.
Todos esses temas que a ciência na época de Kardec citava. estão se desenvolvendo apenas agora em nossos dias.
Revista ESPIRITISMO & CIENCIA. Ano 4 nº40
3 comentários:
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